"...Da autoridade secular, até que ponto se lhe deve obediência. Em primeiro lugar,temos que fundamentar bem o direito e a espada secular para que ninguém duvide que ela existe no mundo por vontade e ordenação de Deus. As palavras que fundamentam são: Rm 13.1,2: 'Toda alma esteja submissa ao poder e à autoridade, pois não há poder que não seja de Deus: onde quer que haja poder ele foi ordenado por Deus. Quem, pois, resistir ao poder, resisti à ordenação de Deus. Quem, todavia, resiste à ordenação de Deus, este atrai sobre si a condenação'. Idem 1 Pe 2.13: 'Sede submissos a toda ordem humana, seja ao rei, como o mais nobre, ou a seus procuradores que são por eles enviados para castigar os maus e recompensar os piedosos'. O direito dessa espada existiu desde o começo do mundo. Pois quando Caim matou Abel, teve tanto medo de que também o matassem que Deus, inclusive, proibiu isso expressamente e tornou sem efeito a espada para que ninguém o viesse a matar. Não teria tido esse medo, caso não tivesse visto e ouvido desde Adão que se deve matar os assassinos. Além disso, Deus reintroduziu essa lei expressamente após o dilúvio e confirmou ao dizer em Gn 9.6: 'Se alguém derramar sangue humano, o seu será, por sua vez, derramado pelo homem'. Isso não pode ser compreendido no sentido de ser um flagelo ou castigo que haveria de cair sobre o assassino da parte Deus; pois muitos assassinos continuam vivos por pagarem fiança ou por serem favorecidos e morrem sem a espada. Diz-se aí a respeito do direito da espada que um assassino é réu de morte e que pelo direito deve ser morto. Agora, se a justiça for impedida e se a espada é morosa, de sorte que o assassino venha falecer de morte natural, nem por isso a Escritura esta errada ao dizer: 'Quem derramar sangue humano há que se derramar seu sangue pelo homem'. Pois é culpa ou iniciativa do homem caso o direito ordenado por Deus não for cumprido, da mesma forma como também são transgredidos outros mandamentos de Deus. No mais, também foi confirmado pela Lei de Moisés, Êx 21.14: 'Quem matar alguém propositalmente, a esse arrancarás do meu altar, para que seja morto'. E ali se lê segunda vez: 'Corpo por corpo, olho por olho, dente por dente, pé por pé, mão por mão, ferida por ferida, galo por galo'. Também Cristo o confirma, quando disse a Pedro no jardim: 'Quem tomar a espada,pela espada morrerá' (Mt 26.52), o que deve ser entendido no mesmo sentido de Gn 9.6: 'Quem derramar sangue humano,etc.' Com esta palavra Cristo aponta, sem dúvida, para aquela passagem e com ela cita aquela palavra e quer tê-la confirmada. Do mesmo modo ensinou também João Batista; quando os soldados perguntaram pelo que deveriam fazer,respondeu: 'A ninguém maltrateis nem façais injustiça, e contentai-vos com vosso soldo.' (Lc 3.14). Se a espada não fosse uma instituição divina, teria que ordenar-lhes que se distanciassem dela, pois sua finalidade era a de levar o povo à perfeição e de instruí-lo cristãmente. Portanto, é certo e suficientemente esclarecido que é da vontade de Deus que a espada e o direito secular sejam usados para castigar os maus e proteger os piedosos.”...
Martinho Lutero - Obras Selecionadas - vol. 6 (Ética: Fundamentação da Ética Política, Governo, Guerra dos Camponeses, Guerra Contra os Turcos, Paz Social.) - p. 82, 83, Editora Sinodal, Concórdia Editora LTDA.
Fonte: Bruno E Jucy Dias (Facebook)